Trabalho infantil cresce na Grande São Paulo
O mesmo ocorre em Porto Alegre e Belo Horizonte, mas índice cai nas demais metrópoles
Milton Michida/AE
O garoto Adam, no lixão de Carapicuíba, procura metais para vender e ajudar no sustento da família
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CARLOS FRANCO
Os olhos azuis com tonalidade ligeiramente cinza do garoto de 13 anos
brilham ao se depararem com metais nada preciosos que se ocultam em meio a
toneladas de lixo. É uma cena insólita. Como milhares de outros garotos
brasileiros, Adam Luiz Lopes está fora da ordem natural dos meninos de sua
idade. Em vez de estar num banco de escola, freqüenta todos os dias um dos
muitos lixões da Grande São Paulo. Sua família depende disso para garantir o
prato de que ele mais gosta: "Macarrão com muito extrato de tomate." Adam
tem de encontrar alguns quilos de metal desprezado pelos habitantes da
cidade para que se transformem no R$ 1,60 suficiente para o macarrão e o
extrato, de segunda, que fazem seus olhos brilharem.
Adam não está sozinho na jornada que começa às 6 horas, quando os primeiros
caminhões chegam ao lixão de Carapicuíba. Dando duro todos os dias, das 6 às
17 horas, Adam mais uma vez está fora da ordem natural dos meninos da sua
idade quando o assunto são estatísticas de trabalho infantil. De 1982 e
1999, o porcentual de crianças de 10 a 15 anos trabalhando nas grandes
regiões metropolitanas do País apresentou queda significativa, de 13,24%
para 4,5%.
Adam também não chega a escrever o nome, mas sabe, de cor, o valor do quilo
de metal: "O alumínio vale R$ 1,20, mas é difícil porque tem de catar 80
latas para dar 1 quilo, o ferro que é mais fácil de achar vale R$ 0,40, mas
se acha cobre aí é que é bom: vale R$ 1,80." É assim Adam explica o por quê
de os meninos do Brasil e até adultos disputarem tanto essas latas nas ruas
do País.
As estatísticas constam de estudo recém-concluído pelo economista Marcelo
Cortes Neri, do Centro de Pesquisas Sociais da Fundação Getúlio Vargas
(FGV). Alguns resultados são surpreendentes, como o que constata que o
porcentual de trabalhadores nessa faixa etária em São Paulo é de 11,5%, ante
6,2% em Salvador e 6,22% no Rio.
"As políticas de estímulo à educação nas Regiões Norte e Nordeste tiveram
efeito positivo, enquanto o trabalho infantil se manteve e até cresceu nas
regiões metropolitanas de São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte, onde a
situação de ensino sempre foi melhor", diz Neri.
Para o economista, esse processo é resultado de vários fatores, entre os
quais a renda e a escolaridade dos pais, bem como a expansão das
oportunidades de trabalho para crianças de 10 a 15 anos numa grande
metrópole como São Paulo. "Quando há retomada da atividade econômica,
aumenta a informalidade, na qual a criança passa a ser vista como
mão-de-obra complementar, da mesma forma que também é chamada ao trabalho
quando a renda do emprego formal da família está em queda", diz Neri.
Informalidade - O resultado de São Paulo não indica,
porém, que cidades como o Rio e Salvador não empreguem esse tipo de
mão-de-obra, mas Neri assinala que nessas duas regiões metropolitanas a
informalidade da economia tradicionalmente foi maior do que em São Paulo. "A
informalidade cresce quando aumentam as dificuldades da família e não chega
a ter impacto estatístico quando já está incorporada à economia", explica.
Ou seja, o porcentual de crianças trabalhando no Rio e em Salvador diminui
por força da escola e do trabalho de organizações não-governamentais,
enquanto em São Paulo elas começaram a se espalhar por outras atividades
informais. Algumas delas são recentes, por exemplo, as de cobradores de
transportes alternativos, como peruas e vans, e outras antigas, como o
garimpo dos lixões.
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