Segunda-feira,
27 de março de 2000
São Caetano do Sul destoa por ter maior renda e menos pobres

ROBERTA SAMPAIO

São Caetano do Sul é o município mais rico de São Paulo, segundo o Mapa da Pobreza Paulista, elaborado pelo economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas. A primeira parte do estudo - divulgada no ano passado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que participou da iniciativa - traz um levantamento da pobreza nos municípios mais representativos do Estado. A cidade do ABC, localizada a 12 quilômetros da capital e com população aproximada de 150 mil habitantes, destoou por apresentar a maior renda domiciliar per capita e a menor proporção de pobres.

"O próximo passo é analisar as condições de vida da população com base em variáveis que dependem de decisão municipal, como educação fundamental, tempo de transporte e sistemas de lixo, água e esgoto", anuncia Neri. Os índices já apontados, nos quais São Caetano do Sul sai vitorioso, contribuem para a boa prestação de serviços do município e o alto grau de cidadania dos moradores. No último indicador de desenvolvimento humano (IDH), levantado pela Secretaria Estadual de Economia e Planejamento com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o município ficou em quinto lugar, com índice de 0,8917, classificado como alto.

Para essa classificação são considerados esperança de vida, índice de educação (taxas de alfabetização de adultos e de matrícula nos ensinos fundamental, médio e superior) e renda per capita. O prefeito Luiz Olinto Tortorello (PTB) alega, no entanto, que a cidade não é a mais rica em termos de orçamento. "São Bernardo do Campo e Guarulhos, nesta ordem, estão na nossa frente", afirma. "A diferença é que não devemos nada a ninguém e, desde 1997, fechamos com superávit."

Segundo Tortorello, o orçamento oscila em torno de R$ 180 milhões e vem, principalmente, da arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A garantia está na montadora General Motors, a maior fábrica do município, que ajudou a compensar o deslocamento de outros setores da indústria para localidades vizinhas. Outro ponto que favorece a receita é o tamanho reduzido da cidade, de 15 quilômetros quadrados - apontada como a menor do País, atrás de Olinda, em Pernambuco - que se destaca por não ter favelas.

Educação - De acordo com dados da prefeitura, a maior parte do orçamento é destinada à educação. São investidos 35%, mais que o índice determinado pela Constituição, de 25%. Essa valorização do ensino não é exclusividade da atual gestão, já que a maior parte das escolas municipais foi fundada na década de 70, sobretudo as que fazem parte do Programa de Educação Alternativa, que é desenvolvido paralelamente ao sistema formal de educação.

Formado por nove núcleos, o programa acolhe quem não se enquadra na rede convencional ou quem busca caminhos alternativos para entrar no mercado de trabalho. Entre outras, fazem parte a Escola de Educação Especial Anne Sullivan, para deficientes neuro-motores, surdos e cegos; a Fundação das Artes; a Escola de Informática; a Escola de Ecologia; o Centro Alcina Dantas Feijão, de ensino médio profissionalizante; e, desde o ano passado, a Escola da Vida, que desenvolve profissionais autônomos (sapateiros, padeiros, manicures, modelos, etc.), como forma de combate ao desemprego.

Já a estrutura formal é beneficiada pela cooperação do município com o Estado, o que tem ocorrido na atual gestão. Hoje, todas as 21 escolas estaduais já sofreram algum tipo de intervenção da prefeitura. A meta é equipá-las com laboratórios de ciências, quadras poliesportivas, salas de informática, materiais didáticos e equipamentos como TVs e vídeos.

Além disso, o município dá uma suplementação de 20% ao salário dos professores do Estado, que atingem uma média de R$ 1 mil; e suporta 147 funcionários na rede estadual. "Os profissionais são periodicamente reciclados", diz o prefeito Tortorello. Para crianças de 0 a 6 anos, há 35 escolas municipais de educação infantil, parte delas funcionando em período integral, para auxiliar pais que trabalham fora. O índice de crianças fora da escola é de 5,3% e de analfabetismo, de 5,6%, bem abaixo da média nacional (14,7%).

Continuidade - A cooperação entre esferas públicas e gestões de partidos diferentes foge da prática comum em outras localidades. "Cada prefeito dá uma contribuição à cidade: se uma obra fica incompleta, o outro termina", fala o comerciante Armando Orlando, morador do município há 66 anos, hoje, à frente do café Nostra Città. "Aqui não é como São Paulo, onde um governante briga com o outro", acrescenta.

Morador há 52 anos, o ex-vereador João Anhê acredita que parte do mérito para o bom desempenho do município é da população. "O povo daqui é muito ordeiro", fala. "Mas com a saída da maior parte das indústrias, São Caetano está virando uma cidade-dormitório."

Ainda com base nas informações da gestão atual, o segundo setor privilegiado é a saúde, que fica com 14% do orçamento. Cerca de 500 pacientes são hoje atendidos por médicos de família, programa que acaba de ser incrementado com o procedimento de internação nos domicílios. "Com isso, vamos desocupar leitos nos hospitais e criar melhores condições para as famílias", aposta o prefeito. Hoje, já há uma grande superação do índice mínimo exigido pela ONU, de 1 leito para cada 1.500 habitantes: são 480 leitos para cada 1.500.

Na segurança, o município complementa o Estado com 2% do orçamento. Paga um abono de R$ 400,00 ao salário dos policiais e mantém cinco postos de polícia comunitária, além de três que estão sendo construídos.

Problemas - Mesmo com o equilíbrio na receita e as diversas ações, o município - que tem uma das densidades demográficas mais altas do País (1.377,93 habitantes por quilômetro quadrado) - não está livre de transtornos. Em termos de planejamento do espaço, falta verde. Há cinco parques, mas a maioria de pequenas proporções, o que faz da cidade uma extensão de São Paulo.

Atualmente, o principal problema são as enchentes. Em janeiro, a prefeitura de São Caetano chegou a decretar estado de calamidade após as chuvas. "O problema é intermunicipal e exige um conjunto de ações", justifica o engenheiro do Departamento de Águas e Esgotos, Denis Striani.

Segundo o economista Marcelo Neri, autor do Mapa da Pobreza Paulista, fora as enchentes, o ABC enfrenta problemas sociais "de rico". "Não há insatisfação de necessidades básicas, mas sim transtornos como poluição, tempo de transporte, imigração, que exigem soluções externas e conjuntas." No caso específico de São Caetano, foi registrado um decréscimo na população, em conseqüência do declínio na indústria e da especulação imobiliária. A maior parte dos moradores que deixou a cidade fazia parte da população de baixa renda, o que contribuiu para um predomínio da classe média.


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